Quem me dera ter a noção de que, em uma quarta-feira como aquela, um novo mundo se abriria aos meus olhos. Com imagens vibrantes, eles chegaram, conduzidos um a um pelas mãos da professora Ana Paula Campos. Ao longo de uma hora e meia, ela os exibiu, contou suas narrativas e foi além: falou como eram, demonstrou a estética e as características que os uniam em um grupo e nos disse, de modo pausado e consistente, que cada um deles carregava um discurso trazido em letras e desenhos – e para além da ficção.
Eles eram livros, mas não de qualquer tipo, nem com qualquer brochura ou tomo. Eles eram ligados à realidade, como “museus de bolso”, passíveis de se levar e trazer. Carregavam em si, cada qual à sua maneira, vastos conhecimentos, narrativas e universos. Em seus miolos podiam caber ciências diversas, histórias do mundo e de objetos, artes já criadas e outras ainda por nascer, sem falar nas narrativas daqueles que sobre a terra já pisaram. De nome livros informativos, eles chegaram!
No início tudo era silêncio
Mas como eles se caracterizam? Quais recursos de linguagem utilizam? E quais são as suas finalidades? O que os aproxima e os diferencia de outros livros relacionados a categorias semelhantes? Essas, entre outras perguntas, semearam nossa conversa, ao longo da qual fomos conduzidos por Ana Paula Campos a imergir no mundo dos livros informativos e nas diversas possibilidades de ser nesse novo cenário de opúsculos. A cada exemplar, uma descoberta, um mundo recontado, um museu.
Conhecidos por vários nomes como livres documentaires, libros de conocimientos, information books ou ainda livros não ficcionais, os livros informativos encontram-se em um campo construído no decorrer dos últimos anos. Conforme destaca Ana Paula Campos, trata-se de um campo marcado por muita produção, mas ainda pouco conteúdo teórico, de modo que sua definição ainda está se consolidando aos poucos. Hoje, porém, já é possível entender alguns pontos e paradigmas que os formam, sobretudo em relação aos assuntos e temas abordados.
Ana evoca que os livros informativos tratam das coisas do mundo, tratando de diferentes realidades de forma não ficcional. A partir de narrativas verídicas, de conhecimentos científicos e das artes, esses livros encontram seu lugar de importância em um campo para além do espaço ocupado pelos livros paradidáticos. Os livros informativos são para serem lidos por prazer e não somente vinculados ao currículo escolar e sala de aula, contudo podem ser utilizados para tal, mas nunca se restringindo só a isso.
E quais são essas histórias?
Outra chave para entender melhor os livros informativos refere-se aos modos de interação entre os conteúdos contidos nesses livros, suas linguagens e recursos. É possível dizer que o “como”, dentro de um livro não-ficcional (informativo), assume tanta importância quanto o “o quê”, de forma que um livro informativo pode envolver um grande guarda-chuva de temas e formas de interação.
Cada livro, portanto, pode recontar, instruir, reportar, explicar, persuadir e discutir, sempre à própria maneira. Para isso, muitas obras têm se apropriado do desenho, de infogramas e até mesmo do uso da ficção e da fantasia como métodos condutores de seus temas. Apesar de os livros informativos negarem a ficção, eles podem criar personagens e desenvolver narrativas para melhor transmitir conhecimentos científicos, artísticos e biográficos.
Segundo a escritora e pesquisadora Sophie Van Der Linder, trazida por Ana Paula Campos para contextualizar a categoria, é possível afirmar que vários tipos de conteúdo podem caber em um livro como esse. A respeito disso, há espaço para diários e críticas, biografias e manuais,assim como para obras publicitárias, jurídicas e acadêmicas.Seu espaço de atuação, portanto, acontece entre a objetividade e a subjetividade, entre a narração e a informação, entre a tradição e imprevisíveis “empréstimos” de outros gêneros e suportes, de forma a “documentar a ficção e oferecer um panorama enriquecido da estética contemporânea”.
É com isso e a partir disso que conteúdos de outras épocas são banhados pelo contemporâneo, permitindo não somente o acesso à visões de outrora sobre o “objeto” de cada livro, como também o estabelecimento de contatos mais amplos em sentidos físicos (para além somente das imagens e da visão), conceituais (com outras camadas de sentidos e entendimentos para os objetos) e relacionais (a partir da ampliação de correlações além das já estabelecidas e demarcadas pela história). De modo a trazer variadas discussões para mais perto das crianças, muitas obras promovem situações em que conteúdos vindos da realidade possam ser integrados aos vários conhecimentos de cada corpo, em suas formas únicas de estar e ser no mundo.
Uma vida em uma única página
Mas que motivos fazem com que os livros informativos abram em nós um mundo? O que do universo deles tem haver conosco? Pessoalmente, acontece que antes de ser educador ou educando, meu interesse e curiosidade pelas coisas do mundo sempre foram maiores do que eu. Desde cedo, queria guardar tudo o que aprendi para conhecer ainda mais sobre o que já sabia. Sempre me interessou a possibilidade de mergulhar nas camadas das coisas, fosse da água do mar ou do bolo de terra que costumava fazer nas brincadeiras.
Lembro, por exemplo, de folhear livros sobre como fazer quase tudo, e essas histórias e conhecimentos me deixavam curioso sobre o ato de criar e também sobre até onde essa criação poderia ir. Ao testemunhar o encontro com Ana Paula Campos, isso veio à tona, deixando nítida a importância desses livros na minha educação, nas minhas formas de interação com o mundo contemporâneo e também na minha atuação profissional.
Ao final do encontro, me percebi instigado a ler os livros informativos apresentados pela convidada, e quem sabe a partir daí encontrar outras camadas de me ver e saber sobre o mundo. Saí da conversa mais instigado e curioso do que havia entrado, e com o entendimento que cada livro informativo é uma grande exposição, um pequeno museu de bolso para levar e trazer, como um universo que ao ser aberto pode se desdobrar infinitamente.